Com coleta de dados, aplicativos próprios e ofertas e serviços personalizados, os shopping centers brasileiros têm cada vez mais apostado no “figital” – conceito que define um modelo de consumo híbrido, ou seja, tanto físico quanto digital.
E, segundo representantes do setor, essa mistura de interações pelos consumidores, que passam a usar vários canais diferentes para pesquisar e comprar, é uma das heranças da pandemia de Covid-19 para o segmento.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), Glauco Humai, a pandemia fez surgir novas modalidades de atendimento dentro dos shopping centers, e acelerou e expandiu o processo de digitalização.
Além da criação de aplicativos, e-commerces, benefícios e programas de fidelidade próprios, o executivo ainda cita exemplos como a instalação de armários nos shoppings para a retirada de compras feitas online – medida que se disseminou na pandemia e que atualmente está presente em pelo menos metade dos estabelecimentos –, e o delivery, opção que, segundo ele, já é oferecida por praticamente todos os shoppings associados à Abrasce.
“A forma de consumir mudou desde aquele período (da pandemia). O consumidor viu a possibilidade de comprar seus produtos quando ele está parado no trânsito, em casa ou em qualquer lugar, e o que veio como uma solução momentânea e conjuntural, acabou se tornando uma mudança estrutural do nosso negócio”, afirma Humai.
Setor investe em tratamento de dados
E não é só. Além das iniciativas digitais com impactos diretos na experiência do consumidor, os investimentos em coleta e tratamento de dados também têm ganhado espaço no orçamento e no planejamento de operações dos shopping centers do país.
Segundo o diretor de operações da Aliansce Sonae, Leandro Lopes, o investimento em gestão de dados na companhia começou há três anos e resultou no Data Lakehouse, uma base de dados única com diversas fontes de informações e que têm ajudado a empresa a analisar padrões de comportamento de compra e recorrência dos clientes.
“O objetivo é conhecer melhor e digitalizar esse consumidor. Atualmente, por exemplo, temos cerca de 35 milhões de visitas por mês, o que nos dá uma base de cerca de oito ou nove milhões de clientes únicos. E a cada visita nós capturamos e cruzamos essas informações, de maneira que conseguimos conhecer o consumidor e elaborar estratégias em cima disso, oferecendo promoções e ações personalizadas”, afirma.
De acordo com o executivo, os dados coletados servem para avaliar o comportamento do consumidor dentro do shopping, analisando dados de venda, compra e fluxo e permitindo entender qual o melhor mix de lojas e produtos a serem ofertados – o que também acaba beneficiando os lojistas.
“Conseguimos coletar os dados das placas de todos os carros que entram nos nossos shoppings, por exemplo, e avaliamos as informações que chegam por meio dos telefones que se conectam em nossa base de dados e pelos consumidores que ligam no nosso SAC, que frequentam nossos ambientes e que participam das nossas promoções”, completa Lopes, destacando que toda a captura de informações está em linha com as exigências da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Do online para o físico
O movimento “figital”, segundo especialistas, também já acontece na ponta contrária, com empresas digitais investindo cada vez mais em espaços físicos.
“Da mesma forma que grande parte dos shoppings e varejistas já trabalham com seus próprios ambientes online, já há exemplos internacionais de empresas com negócios digitais e que abriram lojas físicas. É uma tendência no exterior que também deve se consolidar por aqui”, afirma Ricardo Fioravanti, presidente da FX Data Intelligence.
Ele cita como exemplo a Amazon, que tem lojas físicas que não contam com caixas nem vendedores, e o Google, que abriu sua primeira loja física fora da sede no ano passado. Para Fioravanti, mesmo após a pandemia e diante dos hábitos mais digitais, as lojas físicas continuam tendo uma importância relevante para que as pessoas consigam experimentar e retirar os produtos.
“E em relação aos shoppings, mais do que centros de compras e entretenimento, a tendência é que se tornem cada vez mais digitais e voltados para a experiência do consumidor”